Insurge-se você, meu
amigo, contra as informações do plano espiritual, relacionando as formas de que nos utilizamos. Espanta-se ao saber que temos domicílio próprio, com todo o
equipamento indispensável à vida organizada de quem prossegue evolvendo e
aprendendo sempre.
Assegura que
materializamos excessivamente as imagens e que nossas páginas não passarão
talvez de alucinações da mente mediúnica.
Não estranho sua atitude.
Também eu pensaria o mesmo aí na Terra.
Imagine que eu, homem
versado na experiência de ganhar e perder, via no mundo o terrível esforço do
aluno de primeiras letras, gemendo na articulação do alfabeto, de modo a
penetrar, passo a passo, na oficina da ciência; identificava os tremendos
conflitos impostos a qualquer profissional digno, interessado em
especializar-se, e, no entanto, quando se tratava da morte do corpo, acreditava
piamente que a alma do defunto voaria a pleno céu, à procura do Trono de Deus.
Bastaria o passaporte de alguma religião respeitável e, a meu parecer, o
“morto” entraria nos gozos do paraíso. Sabia que os tribunais humanos ministram
a justiça com atenuantes e agravantes, segundo as circunstâncias prevalecentes
no doloroso drama dos réus e não ignorava que a escala da educação é muito
maior que as cinco linhas da pauta musical. Todavia, nunca me passou pela idéia
que o nosso aprimoramento continuaria intensivo nestas paragens. Admitia que os
“mortos” seriam anjos ou demônios absolutos, exceção dos que fossem detidos no
purgatório pela polícia divina, na situação dos soldados que se demoram na
“terra de ninguém”, porque, para os crentes em geral, o purgatório, entre este
mundo e o outro, é uma espécie de Território do Cerre, entre alemães e
franceses dos últimos séculos.
Como reconhece, sua
concepção de hoje pertenceu-me igualmente, enquanto aí estive.
Nunca pude compreender , a
experiência corporal na Terra como transitório fenômeno de exteriorização do
espírito imperecível; no meu modo de entender, o espírito era projeção do
corpo.
Você já viu engano maior?
No entanto, era um
equívoco que minha vaidade acalentava zelosamente.
Não desconhecia que sábios
ilustres me haviam precedido na estrada do conhecimento, que a sandália dos
heróis e dos santos havia mergulhado na poeira planetária muito antes de meus
pés doentes; contudo, jamais aceitei outros pontos de vista que não fossem os
meus.
O túmulo, porém, impôs-me
a arte do reajustamento.
Contínuo aprendendo com a
ingenuidade do grupo escolar. E rendo graças a Deus pela concepção do ensejo
imprescindível.
Não se julgue nas
vizinhanças do paraíso e nem nos queira mal por darmos notícias de cidades e
instituições, templos e hospitais, árvores e fontes, além do sepulcro...
Quando nossos olhos
imóveis recebem o tradicional emplasto de cinzas, verificamos que o céu está
mais alto e o horizonte mais longínquo.
Você não aplaudiria o
nudismo e acredita que os desencarnados, para serem verdadeiros, não deviam
usar vestimenta alguma; estima a bênção do santuário doméstico, na doce e
amorosa comunhão dos laços afetivos e admite que, para cultivarmos a realidade
universal, cabe-nos a obrigação de adotar regime separatista, vagabundeando de
esfera em esfera, sem objetivo e sem lar. Agrada-lhe a ordem o grêmio
doutrinário a que dedica atenção, mas exige que, em nos comunicando com os
“vivos”, estejamos na condição dos bandos de vespas e passarinhos.
Não acredite que a
sepultura o exonere da responsabilidade individual de prosseguir aprendendo com
o bem. Deus é amor; entretanto, a harmonia é a base de suas manifestações, e um
pai, a fim de ser amoroso, não deixará de ser justo.
Você sabe que o peixe,
para elevar-se das profundezas abismais a que se adaptou, necessita modificar a
bexiga natatória. E que fazer com milhões de mentes humanas, estacionadas em
processos inferiores da inteligência, incapazes de respirar além da atmosfera
densa do vale, se não lhes forem proporcionadas aqui condições de vida análogas
ou profundamente análogas as da Crosta Terrestre?
Não suponha que a morte
lhe venha pregar asas nos ombros.
Se, pelo metro evolutivo,
ainda não possuímos perfeita estatura humana, como aguardar promoção
compulsória ao reino angelical?
Assinalando-lhe os
protestos, lembro-me de pequena fábula que o velho La Fontaine não escreveu.
Dizem que uma borboleta
brilhante, interessada em preparar a lagarta, diante do futuro, pousou na
comunidade em que nascera, com grande escândalo para todo o ninho.
– Em verdade – disse ela –
sou membro da família de vocês, guardo fisiologia semelhante e apesar de ir
longe, através dos ares, vendo cidades e rios, seres e plantas que vocês não
conhecem, continuo sendo um lepidóptero aperfeiçoado... Em breve, vocês serão
tal qual sou e, por minha vez, não me distanciarei excessivamente de nossa
furna, a fim de cuidar dos interesses de nossos descendentes...
Contudo, não pôde
prosseguir. As larvas, de ventre colado ao solo, debandaram sob forte susto.
Todas recusaram a mensagem
e negaram a mensageira. Isto, no entanto, não impediu o trabalho da Natureza.
A borboleta, em breve,
deitava ovos. Dos ovos, nasciam lagartas. As lagartas dormiram em casulos. E
dos casulos surgiam borboletas...
pelo Espírito
Irmão X, Do Livro: Luz Acima, Médium: Francisco Cândido Xavier.
Nenhum comentário:
Postar um comentário