Perguntas como é possível à criatura, finita e limitada, ver o Criador, desde
que Ele é infinito e não tem forma visível.
Irmão, a visão de Deus não consiste em ver com o órgão visual, tal qual
agora podes imaginar ou compreender; por isto se deve entender a visão do
espírito ou inteligência. É uma visão sem imagem; é uma percepção, um
conhecimento, uma expansão de amor irresistível; é a visão real das
manifestações magníficas e inenarráveis da Divindade, a certeza inefável da
presença e do amor infinito de Deus, em vez da visão de uma forma determinada
que, por conseguinte, seria finita e não poderia ser Deus.
Aliás, toda coisa visível logo se torna conhecida e analisada em profundidade,
porque é limitada e, consequentemente, não pode ser uma fonte de bondade eterna
e infinita. Nesta maneira de representar a visão de Deus, cai-se forçosamente
nas ideias pouco inteligentes e retardatárias, bem como na imobilidade dos
bem-aventurados extáticos para sempre no paraíso. Ora, os que, depois de
haverem esgotado as provas das vidas transitórias, chegaram ao topo da escala
espírita, não cessam de ser ativos, porquanto, à medida que o Espírito se
purifica e se aproxima de Deus, participa cada vez mais das perfeições divinas;
e, como Deus é o centro e o foco da eterna atividade da vida, resulta que os
Espíritos puros agem incessantemente, a fim de contribuírem com toda a sua
liberdade e toda a sua força para a realização das vontades do Eterno. Sentem
que o foco da caridade infinita os envolve, que a luz que jorra da face de Deus
os ilumina e que a onisciência do Senhor lhes abre seus tesouros, e que o
Todo-Poderoso os torna livres e fortes para dominarem os elementos, dirigirem
as forças vitais, influírem sobre as inteligências dos Espíritos elevados,
embora não chegados ao topo, e contribuírem eternamente para a manutenção da
harmonia da Criação.
As palavras do apóstolo Paulo: “Videbimus Deum facie ad faciem” e “videbimus
Deum sicuti est” não devem ser tomadas ao pé da letra, porque a criatura jamais
poderá limitar Deus à sua medida, nem se tornar infinita, o que ressalta
literalmente do texto de Paulo. Em vez disso, entendamos que os Espíritos puros
terão noções de Deus sempre mais perfeitas à medida que crescerem em perfeição;
que nunca mais o erro turvará o seu entendimento; que as delícias e o amor
deste bem e desta beleza harmônica sem limite lhes serão desvendadas sempre
mais, séculos após séculos, mas sem jamais conseguirem impor à Divindade nem
limites, nem formas, nem imagens mais ou menos análogas às que são criadas pela
imaginação do homem terreno.
Adeus; trabalha com coragem, porque, pelo trabalho e pelo exercício das
faculdades que Deus te deu, não fazes no presente, com dificuldade, senão o que
farás de outro modo, e com delícias sem-fim, por toda a eternidade, quando
todas essas mesmas faculdades tiverem recebido o desenvolvimento necessário.
Espírito
Anônimo
Genebra, 11 de
janeiro de 1869
Revista Espírita: Jornal de Estudos
Psicológicos - Ano XII, 1869 -
(nº 9 - setembro de 1869)
Allan Kardec
FEB - Federação Espírita Brasileira