HIPERATIVIDADE NA VISÃO DA MEDICINA
ANTROPOSÓFICA
“Em resumo, a
hiperatividade no movimento é causada pela dissociação entre um estímulo e a
não ação, que posteriormente transforma-se no efeito contrário, ou seja, num
agir sem que exista um estímulo causal. Isto também acontece no âmbito do
pensar hiperativo quando, por exemplo, estamos ouvindo um conteúdo mas não
conseguimos permanecer atentos e mesmo escutando bem as palavras não
acompanhamos seu sentido.”
Dr. José
Eduardo Ferraz
Muito se tem publicado a respeito da
hiperatividade, da falta de concentração e outros transtornos de aprendizagem.
O objetivo do presente artigo é trazer mais uma visão desta questão sem a
pretensão de esgotar o assunto, mas sim acrescentar o ponto de vista do autor
embasado na Antroposofia.
A medicina antroposófica sabe que o homem
tem doze sentidos e não somente audição, visão, tato, olfato e paladar.
Entretanto, no âmbito deste artigo só nos cabe abordar os que atuam mais
significativamente no distúrbio hipercinético, quais sejam: sentido do tato,
sentido vital, sentido do movimento e sentido do equilíbrio.
Uma criança com deficiência no tato irá
desenvolver, dentre outros, distúrbios decorrentes da pouca percepção dos
limites do seu corpo, pois é graças ao tato que entramos em contato com nossa
corporalidade.
Deficiências no sentido vital acarretam,
dentre outros distúrbios, comprometimento na sensação de bem-estar. A criança
sente que algo indefinido a incomoda. A exposição a ritmos e hábitos não
naturais acarreta prejuízos físicos e psicológicos à criança.
Deficiência no sentido do movimento
acarreta, dentre outros distúrbios, uma deficiência na percepção dos próprios
movimentos. Deficiência no sentido do equilíbrio leva, dentre outros
distúrbios, a uma dificuldade de se manter em uma direção.
Graças a esse conhecimento a medicina
antroposófica consegue trabalhar com a criança desenvolvendo exercícios
específicos, aparentemente sem ligação direta com a problemática em questão,
mas que são as bases para o tratamento dos sintomas da hiperatividade, da
desatenção e do déficit de aprendizado. A criança deve ter todos esses sentidos
desenvolvidos através de suas atividades cotidianas em ambientes adequados à
idade. Essa vivência corporal, seja no tato, no aconchego, nos movimentos ou no
equilíbrio, irá proporcionar comportamento saudável e seguro. A vivência em
ambientes cheios de estímulos sensoriais, visuais e auditivos dissociados da
participação da consciência corporal, acarretará às crianças desconexão entre
os sistemas nervoso e motor.
O ser humano adulto é, comumente, mais
ativo no pensar e menos nos movimentos. Nas crianças a vivência oposta é que
deve ser proporcionada pelos seus responsáveis. O excesso de imagens e a
escassez de movimentos corporais, como por exemplo ao assistir TV ou jogando
vídeo game, criam uma dissociação que mais tarde levará a um automatismo nos
movimentos, ou nos sentimentos ou ainda nos pensamentos. Os músculos passam a
trabalhar separadamente do pensar, o sentir passa a atuar separadamente da ação
e o pensar fica independente do foco da atenção. Em resumo, a hiperatividade no
movimento é causada pela dissociação entre um estímulo e a não ação, que posteriormente
transforma-se no efeito contrário, ou seja, num agir sem que exista um estímulo
causal.
Isto também acontece no âmbito do pensar
hiperativo quando, por exemplo, estamos ouvindo um conteúdo, mas não
conseguimos permanecer atentos e mesmo escutando bem as palavras não
acompanhamos seu sentido. Além das excessivas impressões visuais e auditivas do
mundo mecanizado, temos que salientar uma outra característica bem própria da
atualidade. Graças à tecnologia as máquinas e aparelhos conseguem velocidades
que a alma humana não acompanha, mas os órgãos sensoriais registram no corpo de
forma inconsciente. Essa qualidade é utilizada, por exemplo, nos comerciais e
desenhos infantis a fim de estimular o consumo de determinados produtos. O
corpo admite, sem grandes prejuízos, até uma certa velocidade além do seu ritmo
natural.
Todo o universo é constituído de sábias
velocidades e de ritmos. A respiração tem ritmo e polaridade (inspiração e
expiração); o ritmo cardíaco (sístole e diástole); o dia e a noite; a vida e a
morte, etc. Na perda ou prejuízo desses ritmos e polaridades, tornamo-nos
inconscientemente pessoas agitadas, desatentas e, com o passar do tempo,
improdutivas. É importante ressaltar que a hiperatividade infantil, na
intensidade com que se apresenta em nossos dias, não acontecia há poucas
décadas atrás quando a televisão, o vídeo game e o computador não eram tão
presentes no cotidiano das pessoas, bem como os estímulos visuais e sonoros nas
ruas e locais públicos também não existiam da forma exagerada de hoje.
Para o tratamento dessas crianças,
vítimas do mundo moderno, a Antroposofia desenvolveu várias terapias, que vão
desde medicamentos dinamizados, até exercícios que promovem o desenvolvimento
dos sentidos não corretamente desenvolvidos.
Nas escolas de orientação antroposófica
(Pedagogia Waldorf) o currículo é organizado de forma a contemplar o pleno
desenvolvimento dos doze sentidos através de uma prática pedagógica que
propicia às crianças espaços e vivências lúdicas, naturais e artísticas sem
utilização de aparelhos eletrônicos e outros meios artificiais.
Para finalizar gostaríamos de salientar
que as crianças assimilam intensamente o ambiente ao seu redor e manifestam
esse “aprendizado” através do seu agir na vida.
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