FÁBULA
SIMPLES
Quando o
diamante já talhado se abeirou da pedra preciosa, saída de cerro áspero,
clamou, irritadiço:
― Que
coisa informe! Rugosidades por todos os lados!... Que farei de semelhante
aborto da Natureza?
E roçou,
com superioridade, sobre a pedra bruta.
A pobrezinha,
mal saída do solo em que dormira por milênios, sentindo-se melindrada, tentou
reclamar, entretanto, ao observar o clivador, cheio de esperança na utilidade
que ela podia oferecer, calou-se.
Findo o
dia, o operário recebeu o salário que lhe competia e contemplou-a, tomado de
gratidão.
A pedra
intimamente compensada, esperou.
No dia
seguinte, veio o martelo cônico e, desapiedado, riu-se dela, exclamando:
― Nariz
de rochedo, quem teria o mau gosto de aperfeiçoar-te? Porque a infelicidade de
entrar em comunhão contigo, seixo maldito?
O cristal
sofredor ia revidar, mas vendo que o trabalhador, que mobilizaria a massa
contra ele, o mirava com enternecimento, preferiu silenciar, entregando-se
paciente à nova operação de lapidagem.
Sabendo,
em seguida, que o operário obtinha, feliz, substanciosa paga, reconheceu-se
igualmente enriquecido.
Mais
tarde, apareceu o pó de diamante, que gritou, irônico:
― Porque
a humilhação de trabalhar essa pedra amarelada e baça? Quem teria descoberto
esse calhau feio e desvalioso?
A pedra
ia responder, protestando; contudo, reparou que o lapidário a fixava com
respeito, denotando entender-lhe a nobreza interior, e, em homenagem àquele
silencioso admirador de sua beleza, emudeceu e deixou-se torturar.
Quando o
lapidador recolheu o pagamento que lhe cabia, deu-se ela por bem remunerada.
Logo após
chegou a mó de polir, que falou, mordaz:
― Esta
velha cristalização de carbono é indigna de qualquer tratamento... Que poderá
resultar dela? Porque perder tempo com este aleijão da mina?
A pedra
propunha-se aclarar a situação; contudo, notando a jubilosa expectativa do
artífice que lhe identificara a grandeza, aquietou-se, obediente, e suportou
com calma todos os insultos que lhe foram desferidos sobre as faces, até que o
próprio polidor a acariciou, venturosamente.
Sem
perceber-lhe o valor, o diamante talhado, o martelo, o pó de diamante e a mó
viram-na sair, colada ao coração do operário, em triunfo, permanecendo
espantados e ignorantes, na sombra da suja caverna de lapidação em que a
presença deles tinha razão de ser.
Passados
alguns dias, a pedra convertida em soberbo brilhante foi engastada no cetro do
governador do seu país natal, passando a viver, querida e abençoada, sob a
veneração de todos.
Se
encontras-te no mundo criaturas que se fizeram diamante descaridoso, martelo
impiedoso, pó irônico ou mó sarcástica sobre o réu coração, suporta-as com
paciência, por amor daqueles que caminham contigo, e espera, sem desânimo,
porque, um dia, transformada a tua alma em celeste clarão, virás à furna
terrestre agradecer-lhes as exigências e os infortúnios com que te alçaram à
glória dos cimos!...
pelo Espírito Irmão X - Do livro: Contos Destas e Doutra Vida,
Médium: Francisco Cândido Xavier
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