AÇÃO DA PRECE. TRANSMISSÃO DO PENSAMENTO
A prece é uma invocação, mediante a
qual o homem entra, pelo pensamento, em comunicação com o ser a quem se dirige.
Pode ter por objeto um pedido, um agradecimento, ou uma glorificação. Podemos
orar por nós mesmos ou por outrem, pelos vivos ou pelos mortos. As preces
feitas a Deus escutam-nas os Espíritos incumbidos da execução de suas vontades;
as que se dirigem aos bons Espíritos são reportadas a Deus.
Quando alguém ora a outros seres que
não a Deus, fá-lo recorrendo a intermediários, a intercessores, porquanto nada
sucede sem a vontade de Deus.
10. O Espiritismo torna compreensível
a ação da prece, explicando o modo de transmissão do pensamento, quer no caso
em que o ser a quem oramos acuda ao nosso apelo, quer no em que apenas lhe
chegue o nosso pensamento. Para apreendermos o que ocorre em tal circunstância,
precisamos conceber mergulhados no fluido universal, que ocupa o espaço, todos
os seres, encarnados e desencarnados, tal qual nos achamos, neste mundo, dentro
da atmosfera. Esse fluido recebe da vontade uma impulsão; ele é o veículo do
pensamento, como o ar o é do som, com a diferença de que as vibrações do ar são
circunscritas, ao passo que as do fluido universal se estendem ao infinito.
Dirigido, pois, o pensamento para um ser qualquer, na Terra ou no espaço, de
encarnado para desencarnado, ou vice-versa, uma corrente fluídica se estabelece
entre um e outro, transmitindo de um ao outro o pensamento, como o ar transmite
o som.
A energia da corrente guarda proporção
com a do pensamento e da vontade. E assim que os Espíritos ouvem a prece que
lhes é dirigida, qualquer que seja o lugar onde se encontrem; é assim que os Espíritos
se comunicam entre si, que nos transmitem suas inspirações, que relações se estabelecem
a distância entre encarnados.
Essa explicação vai, sobretudo, com
vistas aos que não compreendem a utilidade da prece puramente mística. Não tem
por fim materializar a prece, mas tornar-lhe inteligíveis os efeitos, mostrando
que pode exercer ação direta e efetiva. Nem por isso deixa essa ação de estar
subordinada à vontade de Deus, juiz supremo em todas as coisas, único apto a
torná-la eficaz.
11. Pela prece, obtém o homem o
concurso dos bons Espíritos que acorrem a sustenta-lo em suas boas resoluções e
a inspirar-lhe ideias sãs. Ele adquire, desse modo, a força moral necessária a
vencer as dificuldades e a volver ao caminho reto, se deste se afastou. Por
esse meio, pode também desviar de si os males que atrairia pelas suas próprias
faltas. Um homem, por exemplo, vê arruinada a sua saúde, em consequência de
excessos a que se entregou, e arrasta, até o termo de seus dias, uma vida de
sofrimento: terá ele o direito de queixar-se, se não obtiver a cura que deseja?
Não, pois que houvera podido encontrar na prece a força de resistir às
tentações.
12. Se em duas partes se dividirem os
males da vida, uma constituída dos que o homem não pode evitar e a outra das
tribulações de que ele se constituiu a causa primária, pela sua incúria ou por
seus excessos (cap. V, n~ 4), ver-se-á que a segunda, em quantidade, excede de
muito à primeira. Faz-se, portanto, evidente que o homem é o autor da maior
parte das suas aflições, às quais se pouparia, se sempre obrasse com sabedoria
e prudência.
Não menos certo é que todas essas
misérias resultam das nossas infrações às leis de Deus e que, se as
observássemos pontualmente, seríamos inteiramente ditosos. Se não ultrapassássemos
o limite do necessário, na satisfação das nossas necessidades, não apanharíamos
as enfermidades que resultam dos excessos, nem experimentaríamos as
vicissitudes que as doenças acarretam. Se puséssemos freio à nossa ambição, não
teríamos de temer a ruína; se não quiséssemos subir mais alto do que podemos, não
teríamos de recear a queda; se fôssemos humildes, não sofreríamos as decepções
do orgulho abatido; se praticássemos a lei de caridade, não seríamos
maldizentes, nem invejosos, nem ciosos, e evitaríamos as disputas e dissensões;
se mal a ninguém fizéssemos, não houvéramos de temer as vinganças, etc.
Admitamos que o homem nada possa com
relação aos outros males; que toda prece lhe seja inútil para livrar-se deles;
já não seria muito o ter a possibilidade de ficar isento de todos os que
decorrem da sua maneira de proceder? Ora, aqui, facilmente se concebe a ação da
prece, visto ter por efeito atrair a salutar inspiração dos Espíritos bons,
granjear deles força para resistir aos maus pensamentos, cuja realização nos
pode ser funesta. Nesse caso, o que eles fazem não é afastar de nós o mal,
porém, sim, desviar-nos a nós do mau pensamento que nos pode causar dano; eles
em nada obstam ao cumprimento dos decretos de Deus, nem suspendem o curso das
leis da Natureza; apenas evitam que as infrinjamos, dirigindo o nosso livre-arbítrio.
Agem, contudo, à nossa revelia, de maneira imperceptível, para nos não subjugar
a vontade. O homem se acha então na posição de um que solicita bons conselhos e
os põe em prática, mas conservando a liberdade de segui-los, ou não. Quer Deus
que seja assim, para que aquele tenha a responsabilidade dos seus atos e o
mérito da escolha entre o bem e o mal. E isso o que o homem pode estar sempre
certo de receber, se o pedir com fervor, sendo, pois, a isso que se podem
sobretudo aplicar estas palavras: "Pedi e obtereis."
Mesmo com sua eficácia reduzida a
essas proporções, já não traria a prece resultados imensos? Ao Espiritismo fora
reservado provar-nos a sua ação, com o nos revelar as relações existentes entre
o mundo corpóreo e o mundo espiritual. Os efeitos da prece, porém, não se
limitam aos que vimos de apontar.
Recomendam-na todos os Espíritos.
Renunciar alguém à prece é negar a bondade de Deus; é recusar, para si, a sua
assistência e, para com os outros, abrir mão do bem que lhes pode fazer.
13. Acedendo ao pedido que se lhe faz,
Deus muitas vezes objetiva recompensar a intenção, o devotamento e a fé daquele
que ora. Daí decorre que a prece do homem de bem tem mais merecimento aos olhos
de Deus e sempre mais eficácia, porquanto o homem vicioso e mau não pode orar
com o fervor e a confiança que somente nascem do sentimento da verdadeira
piedade. Do coração do egoísta, do daquele que apenas de lábios ora, unicamente
saem palavras, nunca os ímpetos de caridade que dão à prece todo o seu poder.
Tão claramente isso se compreende que, por um movimento instintivo, quem se
quer recomendar às preces de outrem fá-lo de preferência às daqueles cujo
proceder, sente-se, há de ser mais agradável a Deus, pois que são mais
prontamente ouvidos.
14. Por exercer a prece uma como ação
magnética, poder-se-ia supor que o seu efeito depende da força fluídica. Assim,
entretanto, não é. Exercendo sobre os homens essa ação, os Espíritos, em sendo
preciso, suprem a insuficiência daquele que ora, ou agindo diretamente em seu
nome, ou dando-lhe momentaneamente uma força excepcional, quando o julgam digno
dessa graça, ou que ela lhe pode ser proveitosa.
O homem que não se considere
suficientemente bom para exercer salutar influencia, não deve por isso
abster-se de orar a bem de outrem, com a ideia de que não é digno de ser escutado.
A consciência da sua inferioridade constitui uma prova de humildade, grata
sempre a Deus, que leva em conta a intenção caridosa que o anima. Seu fervor e
sua confiança são um primeiro passo para a sua conversão ao bem, conversão que
os Espíritos bons se sentem ditosos em incentivar. Repelida só o é a prece do
orgulhoso que deposita fé no seu poder e nos seus merecimentos e acredita
ser-lhe possível sobrepor-se à vontade do Eterno.
15. Está no pensamento o poder da prece, que por nada depende
nem das palavras, nem do lugar, nem do momento em que seja feita. Pode-se,
portanto, orar em toda parte e a qualquer hora, a sós ou em comum. A influência
do lugar ou do tempo só se faz sentir nas circunstâncias que favoreçam o recolhimento.
A prece em comum tem ação mais poderosa, quando todos os que oram se associam
de coração a um mesmo pensamento e colimam o mesmo objetivo, porquanto é como
se muitos clamassem juntos e em uníssono. Mas, que importa seja grande o número
de pessoas reunidas para orar, se cada uma atua isoladamente e por conta
própria?! Cem pessoas juntas podem orar como egoístas, enquanto duas ou três, ligadas
por uma mesma aspiração, orarão quais verdadeiros irmãos em Deus, e mais força terá
a prece que lhe dirijam do que a das cem outras. (Cap. XXVIII, nº 4 e nº 5.)
O EVANGELHO
SEGUNDO O ESPIRITISMO
CAP. XXVII –
ÍTEM 9. AÇÃO DA PRECE. TRANSMISSÃO DE PENSAMENTOS
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