Aconteceu em tempos já distantes...
Observando o comportamento irregular das
criaturas humanas, a sua ingratidão e contínua rebeldia, Deus resolveu reunir a
Corte Celeste, a fim de apresentar sua opinião pouco favorável aos seres
inteligentes que, invariavelmente utilizavam do conhecimento e da razão para
protestar, exigir, reclamar contra tudo e todos, demonstrando irritabilidade e
desconsideração para com a Paternidade Divina.
Ante a expectação geral dos anjos,
arcanjos, querubins e potestades, o Senhor explicou que desejava ensinar aos homens
e mulheres terrestres uma forma condigna para O buscarem.
Todos sabiam que Ele residia no Paraíso,
cujo endereço era muito conhecido, e para onde se dirigiam suas queixas e
desgostos, raramente a gratidão e o amor. Assim, Ele estava pensando, pelo menos
por um período, transferir-se da sua morada, para um lugar onde fosse difícil
de ser encontrado. Isso seria uma espécie de férias que Ele desejava
experimentar e uma advertência para os filhos ingratos.
Concedera-lhes os predicados do
pensamento e da lógica, a fim de que pudessem examinar as belezas existentes no
Cosmo, presentes em mil expressões terrenas e, não obstante, na maioria das
vezes, esses atributos eram utilizados para o desregramento, a agressividade e
a insensatez.
Todos os membros da Corte Celeste
concordaram plenamente com a proposta divina e ficaram mais surpresos ainda,
quando o Senhor lhes pediu sugestão sobre um lugar na Terra ou próximo dela
onde pudesse ocultar-se temporariamente.
Após larga reflexão, um serafim muito
honrado pediu vênia para falar, e propôs:
- Acredito que a Lua seria um excelente
lugar para repouso. O silêncio que paira na sua superfície é grandioso, e dali
a observação do planeta terrestre faz-se tão bela quanto emocionante. Sugiro,
portanto, que o Criador a eleja como Vossa próxima residência.
Todos os membros da excelsa assembleia
concordaram com a sugestão tomada com sorrisos de júbilo.
Mas, o Supremo Senhor, após meditar,
redarguiu, preocupado:
- Eu posso prever o futuro, e graças a
essa capacidade, vejo o ser humano chegando ao satélite terrestre e colocando
ali os seus símbolos. Se lá eu estiver, nessa oportunidade, será muito mais
difícil ter que suportar o atrevimento desses visitantes, que certamente não me
deixarão em paz.
Um grande silêncio se abateu sobre
todos, ante a desolação estampada na face do Excelso Pai.
Um arcanjo, que era tido como um dos
mais sábios, pediu licença, e expôs:
- Os oceanos são ainda grande mistério
para os humanos, e o Triângulo das Bermudas apresenta uma fossa muito profunda,
inalcançável. Sugiro que ali seja estabelecida a Vossa residência.
Parecia estar resolvida a questão,
quando o Supremo Chefe respondeu com tristeza:
- O ser humano é capaz de tudo. Posso
prever um futuro não muito distante, no qual, se utilizando de equipamentos
sofisticados e valiosos, ele descerá às maiores profundezas oceânicas, e,
encontrando-me lá, tentará perturbar-me com a sua petulância e imprudência.
Estava-se num grande impasse, quando um
anjo modesto, quase desconsiderado, pediu licença para opinar.
Ele dizia pertencer ao Terceiro Mundo,
onde havia muitos pobres, os quais, sempre se ajudavam, procurando diminuir as
dificuldades que enfrentavam reciprocamente.
As Entidades mais elevadas, ante o
inusitado acontecimento, olharam-no quase com piedade, pensando no que poderia
sugerir um modesto anjo encarregado da limpeza do Paraíso!
Mas Deus, por misericórdia, olhou na
direção do interlocutor e, com muita ternura, interrogou-lhe:
- Se tens alguma ideia, dize-nos. Em que
lugar pensas que me poderei ocultar, a fim de não ser afligido pelos seres
humanos?!
Eu sugiro, Senhor - redarguiu o anjo
humilde, que vos oculteis no coração da própria criatura humana, porque ali
somente chegarão aqueles que muito se esforçarem para alcançar a própria
evolução, e esses, quando a conseguirem, respeitar-vos-ão, entoando hinos de
louvor à Vossa Majestade.
Houve uma comoção que tomou conta de
todos, que passaram a aplaudir o modesto servidor angelical.
E, a partir daquele momento, Deus passou
a residir no coração do ser humano, somente sendo encontrado por aqueles que
realizam a viagem interior, auto-iluminando-se e amando profundamente ao seu
próximo. Até hoje esse é o lugar preferido por Ele...
FRANCO,
Divaldo Pereira. A Lenda do Esconderijo Seguro. Pelo Espírito Selma Lagerlöf.
LEAL.
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Kardec * * *
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